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Quando a cultura fala mais alto: o que acontece quando a liderança decide olhar de perto a jornada do colaborador

há 2 dias

5 min de leitura

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A transformação da experiência do cliente começa, inevitavelmente, pela experiência do colaborador. Em qualquer organização de serviços, especialmente em hospitalidade, o que o cliente percebe no atendimento é um reflexo direto da cultura que a liderança sustenta (ou tolera) nos bastidores. 


Curiosamente, uma das representações mais didáticas desse impacto aparece em um dorama da Netflix chamado Sorriso Real. A série, ambientada nos bastidores de um hotel centenário, expõe de forma simples e visual aquilo que muitos líderes demoram a perceber: a cultura sempre vence o discurso.


Experiência do colaborador como estratégia de negócio


Gestores e empresários experientes sabem que clima organizacional, engajamento e produtividade não são temas secundários dentro de uma empresa, mas são determinantes econômicos. Uma empresa que opera sob medo, pressão desmedida e relações de poder tóxicas pode até entregar resultados de curto prazo, mas destrói, silenciosamente, o ativo mais difícil de reconstruir: confiança.  


Quando se decide, intencionalmente, redesenhar a experiência do colaborador, não se está apenas “cuidando de gente”; está se reposicionando o negócio. Isso envolve revisar práticas de liderança, critérios de reconhecimento, autonomia na ponta, segurança psicológica e a forma como erros e conflitos são tratados. Ao fazer isso, a empresa deixa de depender de sorrisos protocolares e passa a contar com pessoas que genuinamente defendem a marca.


Da cultura declarada à cultura vivida


Muitas empresas têm valores bem escritos em apresentações e paredes, mas poucas têm esses valores incorporados na prática diária. A alta liderança ocupa o papel central nesse alinhamento: tudo o que ela reforça, ignora ou naturaliza vai, pouco a pouco, definindo a cultura da empresa.  


Uma cultura centrada na experiência do colaborador se evidencia em sinais concretos: líderes que escutam, canais reais de feedback, coerência entre metas e recursos disponíveis, respeito a limites e transparência nas decisões difíceis. Quando essas condições são minimamente atendidas, o colaborador deixa de atuar em modo defensivo e passa a operar com senso de dono, contribuindo ativamente para a melhoria da experiência do cliente.


O papel da liderança: da cobrança ao cuidado com a base


Na alta gestão, costuma ser tentador enxergar a experiência do colaborador como responsabilidade exclusiva de RH ou das lideranças intermediárias. Mas a realidade é outra: o tom é dado no topo. Se o conselho e a diretoria valorizam apenas indicadores de curto prazo, sem olhar para a saúde do sistema que produz esses números, a mensagem que chega à operação é inequívoca.  


Lideranças que assumem o compromisso com a experiência do colaborador aprendem a equilibrar cobrança e cuidado. Isso não significa reduzir o nível de exigência, e sim qualificar a forma como se exige: clareza de objetivos, contexto para as decisões, diálogo adulto e disposição para ajustar rotas quando se percebe que uma política está gerando efeitos colaterais nocivos na cultura.


A experiência do colaborador só ganha sentido estratégico quando se traduz em decisões concretas da liderança. O drama coreano “Sorriso Real” da Netflix, oferece cenas muito claras de como uma mudança de olhar sobre quem faz o trabalho acontecer transforma cultura, reputação e, por consequência, a experiência do cliente.


Quando o VIP é quem sempre esteve nos bastidores


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A série conta uma história de romance que acontece nos bastidores do Hotel King, mas também pode ser uma aula de gestão e cultura organizacional. No centenário do hotel, a escolha dos convidados VIP revela a cultura da organização com mais força do que qualquer discurso. A gestão tradicional seguia um roteiro conhecido: autoridades políticas, grandes empresários, figuras influentes eram os convidados principais, todos alinhados a uma lógica de status e visibilidade, mas distantes da operação diária.


Já a nova gestão, com um olhar mais próximo da jornada do colaborador, decide fazer algo radicalmente simbólico: coloca no centro da celebração o funcionário mais antigo da casa, o porteiro que trabalhava há 30 anos recebendo os hóspedes. Além dele, a funcionária responsável por arrumar quartos, cuidar de detalhes e garantir, silenciosamente, a excelência da experiência ao longo de décadas, dentre outros funcionários que não eram vistos diariamente nas mídias e reuniões de grandes decisões da empresa, mas que faziam a excelência do hotel todos os dias.


Esse gesto muda tudo. Ao trazer para a posição de honra quem nunca era visto, mas sempre foi essencial, a liderança comunica uma nova hierarquia de valor: o verdadeiro VIP é quem sustenta, dia após dia, a promessa da marca.

Em uma festa de 100 anos, dizer que os convidados principais são as pessoas que fazem o hotel funcionar é, na prática, afirmar que a cultura organizacional passa a ser baseada em reconhecimento, pertencimento e respeito aos “invisíveis” da operação. Isso gera uma experiência do colaborador profundamente enriquecedora, e envia ao mercado um recado poderoso sobre que tipo de empresa se quer ser.


Detalhes que encantam: quando o colaborador vai além do óbvio


Outra cena emblemática mostra como a experiência do cliente depende diretamente da qualidade da experiência do colaborador. A atendente da área de salão recebe o pedido de uma hóspede para ser acordada em determinado horário. Cumprir o pedido, por si só, seria apenas “fazer o básico”: telefonar no horário combinado. Mas essa colaboradora, genuinamente feliz e engajada com o que faz, decide ir além. Ela sabe que a hóspede é musicista e, no momento de acordá-la, toca uma música da própria convidada.


O gesto é simples, não demanda orçamento extra nem um grande projeto de inovação. No entanto, o impacto é profundo: a hóspede se emociona, faz questão de agradecer pessoalmente e leva consigo uma memória afetiva poderosa daquele hotel. Esse tipo de encantamento só acontece quando o colaborador tem espaço para exercer autonomia, sente orgulho do que faz e percebe que a cultura não sufoca sua criatividade. Ou seja, quando sua própria jornada é minimamente satisfatória. Não se trata de “talento individual” apenas; trata-se de uma gestão que cria condições para que o colaborador queira, e possa, fugir do óbvio.


Experiência do colaborador como base da experiência do cliente


Esses dois momentos da série, a festa de 100 anos com foco nos colaboradores “invisíveis” e o despertar da hóspede com a sua própria música, ilustram, de forma muito concreta, um princípio que defendemos muito no Instituto Experiência do Cliente: não existe experiência do cliente consistente sem uma experiência do colaborador bem cuidada. Quando a liderança escolhe celebrar quem está na base, ela reconfigura prioridades; quando legitima atitudes criativas que geram encantamento, ela reforça comportamentos que elevam o padrão de serviço.


O dorama funciona como um exemplo de como decisões simbólicas combinadas a pequenos gestos no atendimento constroem um ecossistema em que colaboradores se sentem vistos, respeitados e motivados a entregar o melhor. A série não é o foco, mas ajuda a visualizar aquilo que a teoria de gestão e cultura organizacional repete há anos: jornada do colaborador e jornada do cliente são duas faces da mesma estratégia. Quando a empresa decide, de fato, valorizar quem faz a operação acontecer, o resultado aparece dentro e fora: no orgulho de pertencer e na experiência memorável que o cliente leva para casa.


Se a experiência do colaborador na sua organização fosse transformada em uma narrativa, como tantas que vemos nas telas, ela inspiraria orgulho ou constrangimento?

Decidir conscientemente qual história se quer escrever daqui para frente traz para a empresa pessoas que não apenas vestem a camisa, mas ajudam a desenhar o próprio uniforme.


Maria Júlia Araújo

Instituto Experiência do Cliente


há 2 dias

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